Zoneamento Ecológico-Econômico amplia áreas de proteção e prevê proibição de novos condomínios
Entre os próximos passos, está a realização de audiências públicas nos quatro municípios, ainda sem data definida, para apresentação da Minuta final de Revisão do Decreto e dos Mapas de cada cidade.
Fonte: Assessoria de Imprensa | Instituto Conservação Costeira
O litoral norte de São Paulo, conhecido por suas belezas naturais e que é praticamente “abraçado” pela exuberância da Mata Atlântica, contará brevemente com regras ainda mais rígidas para a construção de novos empreendimentos imobiliários nas praias com o metro quadrado mais caro do país. É que após acaloradas discussões e polêmicas, o Grupo Setorial de Coordenação do Gerenciamento Costeiro (Gerco), organizado pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente, aprovou a proposta técnica de revisão do Zoneamento Ecológico-Econômico (ZZE) do Litoral Norte, ampliando ainda mais as áreas protegidas.
O grupo, órgão colegiado composto por representantes do Estado, prefeituras e sociedade civil dos municípios de Caraguatatuba, Ilhabela, São Sebastião e Ubatuba, aprovou os novos mapas que vão compor a proposta de revisão do ZEE-Litoral Norte. O trabalho é resultado de seis anos de discussões técnicas sobre os ajustes necessários para garantir o desenvolvimento sustentável da região. Agora, a proposta será submetida a consultas públicas e deliberação final do Conselho Estadual do Meio Ambiente.
A revisão técnica do zoneamento buscou encontrar respostas para as diferentes demandas dos atores sociais em torno das questões de desenvolvimento socioeconômico e conservação ambiental. Teve como resultado um olhar especial para questões como a preservação das unidades de conservação, o respeito às comunidades tradicionais, a proteção e manejo dos recursos marinhos, a sustentabilidade das atividades do setor náutico.
Pressão imobiliária
Segundo a procuradora da República Maria Rezende Capucci, as quatro prefeituras tentaram aprovar áreas para a construção de condomínios, mas as administrações municipais desistiram após pressão de entidades da sociedade civil, como o Instituto Conservação Costeira (ICC), Centro de Biologia Marinha (Cebimar) da Universidade de São Paulo (USP), o Instituto Ilhabela Sustentável (IIS) e o Ilhabela Convention & Visitors Bureau de Ilhabela.
“O governo do Estado votou a nosso favor e a pressão imobiliária acabou sendo deixada de lado”, comemorou a presidente do ICC, Fernanda Carbonelli. “Nesta fase final em que os mapas foram apresentados, houve muitas divergências e intensa participação destas organizações não-governamentais, uma vez que as propostas municipais apresentavam forte indução ao crescimento industrial e urbano nos quatro municípios, o que foi prontamente recusado pela sociedade civil, em conjunto com os representantes do Governo do Estado e dos ministérios públicos Federal e Estadual, com base em coerência e critérios técnicos que norteiam este processo de revisão do zoneamento ecológico econômico, em bases sustentáveis para a região”, explica Fernanda.
O promotor Tadeu Salgado Ivahy Badaró Junior, do Grupo Especial de Defesa do Meio Ambiente do Litoral Norte (Gaema/LN), do Ministério Público do Estado de São Paulo, afirmou que, de todos os atores, “os representantes da sociedade civil de Ilhabela e São Sebastião foram os que melhor assimilaram a ideia de que a região possui um patrimônio ecológico e cultural de valor inestimável, pautando suas propostas a partir dessa premissa”.
De acordo com ele, o processo tem caminhado para uma construção consensual nesse sentido. “A melhor forma de administrar os conflitos é não perder de vista que este é um processo que deve fortalecer o princípio republicano, segundo o qual o interesse público, de todos, deve se sobrepor aos interesses particulares, ainda que legítimos. Não se pode incorrer, neste sentido, em soluções imediatistas. É fundamental, ainda, que o aspecto técnico e científico das discussões seja valorizado”, avalia Bardaró.
A Amab (Associação de Moradores e Amigos de Bairros do Sul de Ilhabela) também comemorou as propostas apresentadas. Segundo a gestora ambiental e representante da entidade, Gilda Nunes, houve uma “evolução muito grande” em relação ao mapa de 2013, que à época, permitiria a urbanização da Praia do Bonete, onde vive uma comunidade tradicional caiçara, assim como a Praia de Castelhanos. “Naquela época, havia um grupo que defendia o crescimento a qualquer custo. Agora, tudo o que a sociedade pediu nas reuniões, foi acatado. Em geral, foi muito bom para as cidades. Somente Caraguatatuba que vai transformar a Fazenda Serramar em Z5, o que permitirá a industrialização do lugar”, destaca.
Ainda segundo a gestora, que também é representante do IIS (Instituto Ilhabela Sustentável), o caso de Ilhabela é mais fácil, pois 85% de seu território já é área de Parque, portanto, há apenas 7% de áreas ocupáveis, na parte mais urbanizada da ilha. “Somente no Canal de São Sebastião que houve uma previsão de crescimento, tornando-se Z4”. Para a procuradora da República Maria Capucci, a proposta também irá beneficiar as comunidades tradicionais caiçaras, as reservas indígenas e as áreas quilombolas da região.
O secretário municipal do Meio Ambiente da Prefeitura de São Sebastião, Eduardo Hipolito do Rego, fundador do Gerco, também comemorou as conquistas. Participando ativamente desde 1998, como membro da sociedade civil ou como representante da prefeitura, ele lembra que, desde então, ocorreram diversas reuniões para se chegar a um contexto final. “De lá para cá, foram muitas puxadas de tapete, interferência dos governos municipais e estadual. Teve uma época que o processo parou, depois deu continuidade, mas em geral, o resultado foi super positivo”, avalia.
Segundo ele, todo o processo necessitava de uma atualização, já que desde 2004, a região do litoral norte recebeu grandes investimentos em obras de grande porte, como a duplicação da Rodovia dos Tamoios, Pré-Sal, obras dos contornos da Tamoios, discussões acerca da ampliação do porto, entre outros empreendimentos. “O texto atualizado corrigiu alguns erros, até porque as obras chegaram mas o nosso território manteve-se estático”.
O secretário lamentou apenas o fato de a maricultura não recebido o devido espaço no novo mapa. “É uma cultura nova, que gera empregos, mas não teve seu devido reconhecimento. São Sebastião e Ubatuba já trabalham neste setor, mas o litoral norte em uma imensidão de mar para que esta cultura pudesse ser mais explorada, mas infelizmente não foi possível mostrar sua importância”, lamentou.
“Foi importante chegarmos a bom termo, conciliando as diversas visões sobre o desenvolvimento sustentável da região para os próximos dez anos”, aponta Eduardo Trani, coordenador de Planejamento Ambiental da Secretaria do Meio Ambiente.
O Gerenciamento Costeiro e a ZEE
O Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro foi instituído pela Lei Federal nº 7.661/88, como parte integrante da Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA (Lei nº 6.938/1981) e da Política Nacional de Recursos do Mar – PNRM (Decreto nº 5.377/2005), com o objetivo de orientar a utilização racional dos recursos, de forma a melhorar a qualidade de vida de sua população e a proteção do seu patrimônio natural, histórico, étnico e cultural.
O Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro, instituído pela Lei nº 10.019/98, estabeleceu objetivos, diretrizes, metas e instrumentos para sua elaboração, aprovação e execução, com a finalidade de disciplinar e racionalizar a utilização dos recursos naturais. A lei estadual definiu a tipologia das zonas, os seus usos permitidos, as atividades proibidas e as penalidades a serem aplicadas no caso de infrações.
O gerenciamento costeiro objetiva promover a descentralização e a regionalização das decisões e ações necessárias, conduzindo o desenvolvimento socioeconômico para a sua sustentabilidade ambiental. O zoneamento tem a função de estabelecer um pacto socioeconômico e ecológico, definindo as áreas que devem ser preferencialmente ocupadas, protegidas ou recuperadas na região, considerando o patrimônio cultural e natural existente, bem como as potenciais oportunidades regionais para o desenvolvimento.
“A atuação do governo do Estado veio ao encontro do ‘grito’ da sociedade civil e movimentos ambientalistas, alinhando as propostas de forma a salvaguardar as riquezas do Litoral Norte. A conquista da mudança de zoneamento na Praia da Baleia, e demais praias como Maresias, Juquehy, Barra do Sahy, e Camburi trarão maior proteção a Mata Atlantica”, afirma a presidente do ICC, Fernanda Carbonelli.
Segundo ela, na Praia da Baleia, a votação capitaneada pelo instituto conquistou um feito histórico, que é modificar de zona urbana que permite condomínios e empreendimentos, para zona de proteção. A mudança de zoneamento permitiu a proteção de diversos trechos e todo o fundo da Baleia, com presença de ecossistemas importantíssimos, fauna e flora ameaçadas de extinção. A medida protegerá grande parte dos remanescentes e maciços florestais que ainda restam na região, inclusive no entorno da APA (Área de Proteção Ambiental) Baleia/Sahy, que convive com a iminência de invasões. E proibiu o avanço da especulação imobiliária. Somente na região sul de São Sebastião, a área protegida e já ampliada mede cerca de 6,1 milhões de metros quadrados preservados.