Apesar de causar problemas à circulação hidrodinâmica, interferindo na fauna, flora e transporte de sedimentos, a Companhia de Docas prevê expansão do porto
O Porto de São Sebastião ocupa, hoje, quase metade da zona costeira da Baía do Araçá, e um projeto de expansão requerido pela Companhia de Docas do Porto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) prevê a ocupação de toda a região. Visando estudar quais foram as consequências acarretadas na área desde a primeira obra do sistema portuário, em 1936, até os dias de hoje, e ainda as conseqüências futuras que a expansão pode trazer, que Bárbara Capelari Villamarin, graduanda do Instituto de Oceanografia (IO) da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveu uma pesquisa para sua monografia de bacharelado.
Além de analisar as conseqüências das obras na região, o estudo também fez uma reconstrução morfológica da zona costeira, e ainda mostrou a mudança da circulação de água no território. Para refazer o desenho da área de costa original do Araçá, Bárbara utilizou imagens de satélite Landsat, mapas, fotos, projetos antigos do porto e cartas náuticas. Com isso, quatro períodos morfológicos foram definidos e inseridos no modelo numérico Delft3D, que foi forçado com a oscilação de maré por um mês para avaliar os impactos na hidrodinâmica local. Os resultados apontaram uma diminuição na circulação da água, e ainda mostrou que o tempo para as partículas deixarem um mesmo local quase dobrou depois da construção do porto. Antes, o que demorava 3,7 dias demora, agora, 6,7 dias. Além disso, a região, que era classificada como baía, hoje é uma planície de maré.
“Isso pode causar uma série de implicações, principalmente na fauna e na flora. Por exemplo, se o fluxo da água é menos intenso, sua força acaba atingindo uma área menor, e então a qualidade da água pode diminuir bastante. No fundo da Baía chega um córrego, que é uma fonte conhecida de esgoto doméstico, e se a circulação atua de forma mais fraca, você pode ter uma piora da qualidade da água ali. Além disso, essa região tem um grande número de moradores que encontram sua fonte alimentar na Baía”, afirma a pesquisadora, e ainda completa: “A região é importante, porque abriga alguns núcleos de manguezais, os últimos de São Sebastião, que ainda sustentam a comunidade caiçara que trabalha ali, e sobrevive da captura do berbigão [molusco bivalve].”
Além disso, com menor circulação de água, o mangue fica empobrecido, uma vez que é a água salgada quem traz os nutrientes necessários à sua sobrevivência. O assoreamento também é outro problema que pode ser gerado devido ao aumento do tempo para o sedimento circular, e consequente aumento na deposição dos sedimentos no local.
Apesar dos esforços da comunidade científica em mostrar os problemas implicados com a expansão do porto, a previsão futura é pessimista. “Devido às características de planície de maré que apresenta, o Araçá representa um ambiente único no litoral de São Paulo. Esse fato corrobora para que a área abrigue um incontável número de organismos marinhos adaptados a este ambiente e, portanto, menos frequentes nos demais domínios costeiros, além de sustentar uma comunidade tradicional caiçara de catadores de berbigão. Ainda que pelos citados motivos a conservação e estudo da área sejam imprescindíveis, o Araçá tem seus dias contados devido às perspectivas de novas obras de expansão do porto”, completa Bárbara.
Fonte: Instituto Oceanográfico – USP | http://www.usp.br/aun/exibir.php?id=6537&edicao=1148