Cidades Sustentáveis, das Ideias à Ação

Metade da humanidade vive atualmente nas cidades. Em 2030, serão 60% os que vivem em regiões urbanas e, em 2050, esse total deverá estar em 70%. No Brasil, a população urbana chega a 85%. E, na medida em que as cidades vão crescendo em tamanho e população, aumentam também a dificuldade de se manter o equilíbrio espacial, social e ambiental no entorno urbano.

Neste contexto, a sustentabilidade torna-se a chave essencial para se pensar e desenvolver políticas públicas nas cidades. Conceito este que precisa ser aplicado de maneira transversal às diferentes áreas de atuação, como educação, cultura, saúde, segurança, habitação, emprego e renda, entre outros.

 

Para isso, devemos pensar os processos que ocorrem nas cidades como ciclos, com fluxos de matéria e energia, sem geração de lixo, cuidando da natureza e das pessoas, compartilhando os excedentes e estabelecendo limites razoáveis ao crescimento, produção e consumo.

Uma das maiores dificuldades que enfrentamos hoje é levar a sustentabilidade da teoria para a prática, ou seja, fazer com que de fato todas as ações e processos incorporem a cultura da permanência, suprindo as necessidades da geração presente sem afetar a possibilidade das gerações futuras de suprir as suas. Mas o que isso significa em termos práticos?

A Plataforma Cidades Sustentáveis é fruto de uma parceria entre a Rede Brasileira por

Cidades Justas e Sustentáveis, a Rede Nossa São Paulo e a Fundação Avina. Tem o objetivo de inspirar ações de gestores públicos, empresas e outras instituições por meio de um banco de práticas de experiências bem-sucedidas em todo o mundo, assim como comprometer os gestores públicos com o desenvolvimento sustentável das cidades (por meio da assinatura de uma Carta Compromisso). 

A estrutura do site da Plataforma Cidades Sustentaveis e da Carta Compromisso foi inspirada nos compromissos de Aalborg, processo que começou em 1994 na I Conferência sobre Cidades Européias Sustentáveis, na cidade dinamarquesa de mesmo nome (http://www.aalborgplus10.dk).

As muitas experiências que estão acontecendo ao redor do mundo mostram que cada vez mais cidades estão trabalhando em prol da sustentabilidade, mudando paradigmas e se adaptado aos grandes desafios da atualidade.

No sul de Londres, por exemplo, foi criado um ecobairro chamado BedZED (Beddington Zero Energy Development) que conseguiu reduzir em 81% o consumo de energia para aquecimento, em 45% o uso de eletricidade (em comparação com a média local), e em 58% o consumo de água (em comparação com a média nacional).

Em BedZED, 60% dos resíduos são reciclados e 86% dos moradores consomem alimentos orgânicos. O habitante de BedZED emite hoje 56% menos CO2 do que o cidadão médio inglês.

Na natureza não existe lixo, tudo se transforma e este processo é necessário para a continuidade da vida. A diminuição do consumo e o reaproveitamento dos materiais são fundamentais diante os limites que apresenta o planeta. Aqui no Brasil encontramos um exitoso programa de reciclagem de resíduos sólidos com inclusão social dos trabalhadores autônomos (catadores e recicladores, entre outros), fomentando e estimulando a organização e a estruturação do trabalho desses agentes ambientais. A cooperativa de catadores Avemare, em parceria com a Prefeitura de Santana de Parnaíba, criou o Programa Lixo da Gente – Reciclando Cidadania, que visa a coleta seletiva por meio de conscientização da população sobre a importância da reciclagem para a preservação ambiental, assim como a inclusão e o desenvolvimento social. Até dezembro 2009 o programa atingiu 40% de Coleta seletiva na cidade.

O transporte e a falta de mobilidade é um problema recorrente nas cidades. Quilômetros de congestionamentos, piora na qualidade do ar e mortes no trânsito são algumas das diversas consequências do mau planejamento nesta área. Em Copenhagen (Dinamarca), por exemplo, todos os dias, 55% dos moradores da cidade vão para o trabalho de bicicleta. Em conjunto, eles pedalam mais de 1.170 mil quilômetros por dia.

Existem cerca de 350 km de ciclovias na cidade, além de outros 40 km de “ciclovias verdes” para lazer. Mais perto do Brasil, em Bogotá (Colômbia), mais de 1 milhão de passageiros viajam pelo Transmilenio por dia e outras 100.000 pessoas utilizam os 340 km de ciclovia para se locomover na cidade.

A escassez de água é um dos grandes desafios da humanidade, e as cidades têm muito a ver com isso. Tóquio tem um dos sistemas de água mais eficientes do mundo. Seu foco no trabalho de reparação no mesmo dia ajudou a reduzir drasticamente a taxa de vazamentos de 20% em 1956 para 3,6% em 2006.

Geração de energia através de fontes renováveis é imprescindível para tornar as nossas cidades mais resilientes. Na China, o governo de Rizhao, uma cidade de quase 3 milhões de habitantes, tornou obrigatória a instalação de aquecedores solares em todos os prédios. E, hoje, 99% das moradias usam aquecedores de água solares.

Barcelona (Espanha) foi a primeira cidade européia a ter uma Lei de Energia Solar Térmica que tornou obrigatória a utilização da energia solar para abastecer 60% da água quente em todas as novas construções e edifícios reformados. Em conseqüência, a cidade aumentou em quase 20 vezes a superfície de painéis solares para aquecimento de água, passando de 1,1 m² por mil habitantes em 2000 para 19 m² por mil habitantes em março de 2005.

A cidade de Woking na Inglaterra decidiu descentralizar a geração de energia. Com o objetivo de reduzir o consumo, tecnologias que geram energia limpa em pequena escala, geralmente na faixa de 3.000 a 10 mil kW, são distribuídas perto de onde a eletricidade é consumida e fornecem uma alternativa ao sistema de energia elétrica tradicional. Desde a implementação do projeto, o consumo de energia da Prefeitura foi reduzido em 48,6%.

Também as cidades pequenas estão agindo frente aos desafios globais. Uma pequena cidade da Austrália chamada Bundanoon conseguiu, depois de uma ampla mobilização social, que a cidade se tornasse a primeira do país a proibir o comércio de garrafas de água descartáveis em seus pontos de venda, reduzindo, entre outros, o desperdício de recursos naturais e as emissões de CO2.

Nesse processo de mudança, a educação é um elemento chave, e países como a Austrália estão cientes disso. Lá acontece a Iniciativa australiana por escolas sustentáveis (AuSSI). Por meio de experiências de aprendizagem da vida real são trabalhadas a melhora na gestão dos recursos e das instalações das escolas (energia, reciclagem e compostagem de resíduos, água, preservação da biodiversidade, paisagismo, produtos e materiais ecológicos) e temas relacionados às questões sociais e financeiras.

Essas e muitas outras iniciativas que estão acontecendo em cidades do mundo demonstram que é possível pensar os processos de uma forma diferente – cuidando, diminuindo, reutilizando, criando, colaborando, realocando os excedentes.

A produção e o acompanhamento de novos indicadores que sirvam para medir as mudanças que desejamos ver acontecer são fundamentais. Na Europa, algumas cidades possuem um indicador que mede a quantidade de habitantes que mora a 300 metros dos serviços públicos básicos, saúde, escolas, lojas de alimentos e espaços e estruturas para atividades culturais e de lazer.

Esses indicadores servem para planejar cidades mais sustentáveis, para desenvolver, executar e avaliar políticas públicas, sempre por meio de metas concretas e do controle social. Nesse processo, a participação da sociedade civil é fundamental, para se transformem em corresponsável pelas decisões tomadas nas nossas cidades.

A Plataforma Cidades Sustentaveis, além de disponibilizar práticas de sustentabilidade urbana que deram certo em diversas cidades do mundo, apresenta também uma ferramenta valiosa para os gestores públicos se comprometerem e pensarem a cidade de uma forma diferente. Foi desenvolvida uma Carta Compromisso, inspirada nos compromissos de Aalborg, processo que começou em 1994 na I Conferência sobre Cidades Européias Sustentáveis, na cidade dinamarquesa de mesmo nome (http://www.aalborgplus10.dk/). Esta Carta oferece uma metodologia para pensar e planejar a cidade que tenta ser o mais sistêmica possível, colocando a sustentabilidade de forma transversal a todas as áreas das políticas públicas.

A Plataforma Cidades Sustentáveis não é um trabalho estanque. O processo continua com a reformulação do site (que será finalizada em breve). Entre outras mudanças, haverá um espaço para que os diferentes atores da sociedade saibam como participar da iniciativa. Também está sendo sistematizado um conjunto de indicadores atrelados aos eixos da Plataforma, escolhidos num processo de construção colaborativo.

Para aqueles gestores públicos interessados em assinar a Carta Compromisso, está sendo desenvolvido ainda um relatório de prestação de contas padrão baseado nesses indicadores. Novas Boas Práticas provenientes de diferentes cidades do mundo estão sendo incorporadas periodicamente. Você pode nos enviar sugestões de Boas Praticas de sustentabilidade urbana no e-mail: plataforma@isps.org.br.

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