Com o que tem à mão e gastando menos, a Alemanha pode liderar um movimento mundial para financiar a saída da energia nuclear, propõe Gunter Pauli neste artigo exclusivo.
Das usinas em funcionamento, 212 têm mais de 30 anos, e, como não se sabe com certeza durante quanto tempo poderão ser seguras, a chefe de governo alemã, Angela Merkel, ordenou o fechamento de todas que têm mais de 30 anos. A relativa decadência da geração nuclear estava clara antes do desastre de Fukushima, no Japão. Em 2010 a União Europeia tinha 143 centrais, bem abaixo do pico de 1989, quando funcionavam 177.
Afirma-se que a energia nuclear pode fornecer eletricidade a menos de US$ 0,06 por kilowatta/hora (kWh). Mas o custo verdadeiro – se forem incluídos os subsídios, os seguros contratados, o apoio financeiro e os gastos com eliminação do lixo radioativo –, chega a US$ 0,25 a US$ 0,30 por kWh. Apesar das enormes subvenções e da proteção legal, os reatores nucleares produziram, em 2010, menos eletricidade do que as fontes renováveis.
Agora que os oceanos Pacífico e Índico estão vedados para novos projetos nucleares, a questão é como o mundo fará para gerar eletricidade renovável e a preço razoável. The Blue Economy (A Economia Azul) nos propõe usar o que temos e estudar a competitividade das inovações sem esperar subsídios. Algumas fontes de calor e eletricidade poderiam reconverter o panorama das energias renováveis. As três inovações mais importantes são:
1. turbinas eólicas verticais localizadas dentro das torres de transmissão de alta voltagem já existentes;
2. redesenho das instalações municipais de tratamento de esgoto para combiná-las com o aproveitamento de resíduos urbanos orgânicos e sólidos para produzir biogás;
3. geração combinada de calor e eletricidade com discos fotovoltaicos de duas faces instalados em contêineres equipados com rastreadores óticos que concentram os raios solares.
Se a Alemanha decidir complementar 500 de suas 9.600 instalações de tratamento de água com geradores eficientes usando a tecnologia da empresa Scandinavian Biogas, que hoje funciona em Ulsan, na Coreia do Sul, o fornecimento elétrico poderia chegar a cinco GW. O biogás é uma forma previsível de geração – ninguém duvida do fornecimento sustentado de lixo orgânico e esgoto – e, portanto, proporciona estabilidade à rede elétrica.
Por meio de turbinas verticais de desenho francês Wind-it colocadas em um terço de suas 150 mil torres de transmissão de alta tensão, a Alemanha poderia gerar mais de cinco GW a uma fração do custo da eletricidade nuclear. Há 1.900 depósitos de lixo na Alemanha. Se fossem ocupados apenas cem hectares em cem desses terrenos mortos com geradores combinados de calor e eletricidade da empresa sueca Solarus, seriam obtidos 1.830 quilowatts térmicos e 610 quilowatts elétricos por hectare, e o fornecimento potencial aumentaria 18,3 GW térmicos e em 6,1 GW elétricos.
O calor pode ser usado para reduzir a demanda de energia destinada a esquentar água, principal item de consumo elétrico dos lares alemães. O consumo diário de eletricidade na Alemanha é, aproximadamente, 70 GW/h e a energia nuclear fornece pouco mais de 20%, ou seja, 15 GW/h. Estes cálculos mostram que com apenas uma fração da infraestrutura existente é possível substituir toda a energia nuclear (5+5+6,1 GW). O custo de produção de cada uma destas alternativas é de US$ 0,02, ou menos, por KW/h. O traslado da energia nuclear para a rede elétrica custa hoje US$ 0,056 por kWh.
O outro benefício óbvio é a criação de emprego. A Alemanha, que já é líder mundial em exportação de tecnologias verdes, poderia se colocar como maior exportador mundial de energia verde. Entretanto, o fator mais poderoso de uma estratégia para abandonar a energia nuclear é que a diferença de preço (US$ 0,036 dólar por KW/h) para os 15 GW hoje fornecidos por reatores nucleares produzirá um benefício anual caído do céu de US$ 6,9 bilhões.
O fluxo de caixa, produzido pela eficiência de tecnologias simples, poderia ser suficiente para financiar por dez anos o abandono da energia nuclear. Assim se conseguira consenso, pois as empresas de energia teriam uma saída, baseada no valor de seus ativos, e seriam retribuídas pelo abandono da opção nuclear. O fechamento forçado dos reatores mais velhos já reduziu o valor dessas centrais em cerca de 25%, e a incerteza atual provavelmente leve a uma queda de suas ações.
Não será difícil encontrar uma solução que permita abandonar a fonte nuclear ampliando os benefícios para todos e reduzindo os riscos. A Alemanha pode se converter em um eixo financeiro mundial da saída da opção nuclear, baseada no pagamento em dinheiro e no consenso.
Este é o objetivo final da economia azul: responder às necessidades básicas de todos com o que temos à mão e oferecer produtos e serviços necessários que sejam bons para a saúde humana e o meio ambiente a um custo menor, ao mesmo tempo em que se cria capital social. Tudo parece indicar que podemos alcançá-la mais rápido do que pensávamos.
* Gunter Pauli é empresário e autor do livro “The Blue Economy”. Direitos exclusivos IPS.
Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.