Economistas cunharam o termo “petro-Estado”, geralmente aplicado a países cuja economia está alicerçada majoritariamente na produção e exportação de petróleo e gás natural.
Nessa linha de raciocínio, há alguns anos, professores da Universidade Cândido Mendes do RJ, que estudam os efeitos dos royalties nos orçamentos dos municípios fluminenses e com quem trocamos experiências durante o seminário “Recursos do Petróleo no Litoral Norte” ocorrido no ano passado, criaram o termo “municípios petro-rentistas”, referindo-se aos municípios cuja receita municipal tem nos royalties sua maior parcela.
É comprovado que países que possuem riquezas naturais em abundância, acabam por provocar a Doença Holandesa (aos leitores interessados ver https://pt.wikipedia.org/wiki/Doen%C3%A7a_holandesa), e percebe-se que isso pode também acontecer nos municípios petro-rentistas, podendo vir a ser um risco para a economia local.
Vejamos o panorama mundial:
O consumo mundial atual é em torno de 96 mm bpd (Milhões de Barris de Petróleo / Dia), sendo o consumo no Brasil de 2,8 mm bpd. Abaixo a lista dos 10 países maiores produtores do mundo (que representam em torno de 70% da produção mundial):
- EUA Produção 17 mm bpd
- Arábia Saudita: 12,2 mm bpd
- Rússia: 11,2 mm bpd
- Irã: 4,9 mm bpd
- Canada: 4,8 mm bpd
- Iraque: 4,5 mm bpd
- Emirados Árabes: 3,9mm bpd
- China: 3,8 mm bpd
- Brasil: 3,2 mm bpd(Petrobras: 2,9 mm bpd , sendo ⅔ do pré sal
- Kwait: 2,7
Sobre o Preço do barril:
O preço médio do barril de petróleo (que apenas como curiosidade, já chegou a valer USD 140 em 2008, seu maior valor histórico), em 2019 esteve em torno de USD 60 o barril (em meados do ano chegou a USD 71), e foi sobre esse valor que foram calculados os royalties.
Existem diversos fatores que influenciam o valor do barril, que vão desde o humor dos países produtores, em especial os árabes, até os novos produtores (lembrar que há 10 anos atrás o Brasil era quase um ilustre desconhecido, e hoje já figura nos top10).
Falando em humor dos países árabes, recentemente houve o ataque aos poços da Arábia Saudita (líder das Petromonarquias) que derrubou pela metade a produção daquele país.
Tão logo restabeleceu sua produção, decidiu inundar o mercado de petróleo, numa disputa particular com a Rússia, que disputa cabeça a cabeça a vice liderança desse mercado, e que desejava através de um cartel elevar o preço dos antigos USD 60 para USD 80.
A Rússia que também tem como alvo os Estados Unidos, reagiu inundando o mercado e fazendo com que o preço internacional despencasse: o valor do barril caiu imediatamente para USD 45, e logo em seguida para USD 30.
E agora o Covid 19 que, ao que tudo indica deixará marcas mesmo depois de sua passagem, provocando mudanças não apenas com uma provável crise econômica, mas com novos paradigmas após a recuperação, com muitos trabalhadores passando a optar (depois de já testado e aprovado) pelo home office. E o que isso tem a ver com este assunto? Tudo! Haverá um menor consumo de combustível, e portanto uma baixa ainda maior no preço do petróleo.
Será que ainda continuará sendo viável a exploração de petróleo se o seu preço de venda for um valor muito baixo (abaixo dos USD 30)? Seria esse o momento de uma nova matriz energética?
Os primeiros afetados serão certamente os Estados Unidos, que têm grande parte de sua exploração provinda do fracking do xisto que extraem por meio de perfurações profundas do solo, com o mais caro processo de exploração, (30 USD / barril , podendo em alguns casos de perfurações mais profundas, chegar até USD 60), e aparentemente já hoje inviabilizado.
No Oriente Médio, o custo de exploração é em torno de USD 10 /barril.
O Brasil também poderá ser afetado. O custo de extração do pré-sal em 2014 era USD 15 / barril, porém com os crescentes avanços tecnológicos promovidos pela Petrobras, esse custo despencou para USD 6 (em terra o custo de extração da Petrobras gira em torno de USD 18/barril).
Estamos falando apenas de extração, acrescentem-se ainda USD 2,6 de refino e mais a USD 9 de participação governamental, chegamos a USD 17,6 além da logística de distribuição.
Dentro da participação governamental, entram os royalties. Percebe-se então, que com uma baixa muito grande no preço do mercado internacional, veria-se o governo obrigado a abrir mão de uma parte de sua participação, o que possivelmente afetaria o valor de repasse dos royalties.
Além disso, ainda que se consiga voltar aos USD 40/barril, estima-se que a queda na arrecadação do petróleo (hoje em torno de R$ 53 bilhões) caia em torno de R$ 20 bilhões (quase 40% de perda a ser refletida diretamente na arrecadação dos entes federativos, incluindo os municípios).
Sobre o município de Ilhabela
Pode se notar a grande quantidade de variáveis que poderá influenciar negativamente na queda das receitas dos royalties.
Nossos royalties em Ilhabela, provêm principalmente do campo Sapinhoá, que produz atualmente em torno de 240 m bpd (aproximadamente 13% da produção total da pré-sal), sendo que esse campo já está entrando na curva de queda da produção.
Temos ainda riscos de perda pela diminuição do valor internacional do barril conforme citado acima, com estimativas de quedas de até 40%, diminuição da produção em função da crise econômica e excesso de oferta entre os grandes produtores, potencial risco de cortes dos royalties, para conseguir um preço interno mais competitivo no mercado internacional, além de nova lei de divisão dos royalties que, com a crise e consequente queda nas receitas municipais, aumentará a pressão dos outros municípios (liderados pela CNM – Confederação Nacional dos Municípios) para a sua redivisão.
Portanto não se trata aqui de discutirmos se iremos ou não perder arrecadação, e sim de QUANTO iremos perder e, nesse sentido, as expectativas mais otimistas são de perda de pelo menos 50% nos próximos anos.