Saneamento e os municípios

Já se foi o tempo em que o confronto de ideologias sobre a participação do capital privado no desenvolvimento da infraestrutura se sobrepunha à própria necessidade de desenvolvê-la.

No Brasil, já passamos pelo processo das concessões federais nas áreas de telecomunicações, transporte e energia. Um só poder concedente, o Federal, atraiu o capital privado para o progresso dessas infraestruturas, o que promoveu desenvolvimento, aumento e diversificação de serviços e redução das tarifas à população.

Também avançamos nas 27 unidades federativas. Os Estados souberam, com maior ou menor intensidade, utilizar a iniciativa privada para complementar a capacidade de investimento do poder público, servindo-se de modelos de concessões, associações e parcerias.

Hoje, a relação entre o público e o privado na União e nos Estados amadureceu, principalmente por superar posições antagônicas e incorporar a noção de que os déficits de infraestrutura são barreiras ao desenvolvimento. Esta tomada de consciência é um legado para as 5.524 cidades do País que ainda precisam desenvolver o que há de mais básico para a qualidade de vida da população – o saneamento.

A esfera municipal é determinante para enfrentar este problema. A urgência em desenvolver os sistemas de água e esgoto requer, atualmente, investimentos da ordem de R$ 13,5 bilhões ao ano para que se alcance, em 15 anos, o acesso universal da população a esses serviços básicos. A cifra corresponde a menos de 0,5% do PIB brasileiro atualmente.

Mas dar atenção necessária ao saneamento significa mais do que oferecer água e esgoto a quem precisa. Significa preservar vidas humanas. Levantamento da Fundação Getúlio Vargas analisou os impactos da precariedade do saneamento brasileiro sobre a saúde da população. Em 2009, dos 462 mil pacientes internados por infecções gastrointestinais, 2.101 morreram. Se houvesse acesso universal ao saneamento, principalmente no que diz respeito ao tratamento de esgoto – que hoje só é realizado em 28,5% dos municípios brasileiros, segundo a mais recente pesquisa do IBGE -, haveria uma redução de 25% no número de internações e de 65% na mortalidade. Ou seja, 1.277 vidas seriam salvas.

Se não bastasse esse quadro a nos motivar, a Lei do Saneamento (Lei 11.445, de 2007) marca uma nova etapa e permite vislumbrar um tempo de grandes perspectivas para redimir esses déficits históricos.

Milhares de prefeitos e câmaras municipais têm a oportunidade de lançar mão de vários mecanismos para a universalização do saneamento, dentro de suas particularidades hídricas e de seus estágios de desenvolvimento. Do acesso ao orçamento público destinado ao PAC a uma grande variedade de modalidades contratuais – como concessões plenas e parciais, PPPs, sub-concessões, locações de ativo e outras alternativas com marcos regulatórios definidos e testados -, há vários caminhos aos quais a iniciativa privada e o poder público podem se associar para realizar esses volumosos investimentos. Algo que, isoladamente, nenhum dos dois poderá desenvolver.

Contribuem para esta nova fase os avanços tecnológicos na gestão dos recursos hídricos, que precisam ser espalhados pelo País. Hoje, enquanto algumas cidades ostentam excelentes índices de 15% de perda de água, fruto de uma eficiente gestão operacional dos sistemas, outras estão estancadas em vergonhosos 75%.

Nos anos 70, o Plano Nacional de Saneamento agrupou municípios e criou empresas estaduais de saneamento. Símbolos desse período, Sabesp, no Estado de São Paulo, e COPASA, em Minas Gerais, hoje são empresas de capital aberto e contam com gestão transparente, governança corporativa e eficiência operacional. São fatores que atraem o capital privado que, por sua vez, exige e cobra resultados – exemplificando mais uma das formas de complementaridade entre os setores público e privado.

Saneamento é prioridade, uma questão de saúde pública. O Brasil não pode perder esta oportunidade. Cabe a esses 5.524 municípios, cada qual à sua maneira e dentro de sua realidade, a tarefa de conjugar uma abundância de marcos regulatórios disponíveis com um fervoroso interesse da iniciativa privada em investir em saneamento, atendendo a uma necessidade urgente de universalizar o acesso aos serviços de água e esgoto.

Cabe a todos não permitir que, no futuro, o País tenha a frustração de voltar no tempo para saber que perdeu, possivelmente, sua maior oportunidade de garantir a todos água e esgoto tratado, benefícios básicos e importantes.

PRESIDENTE DA FOZ DO BRASIL, EMPRESA DO GRUPO ODEBRECHT

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