Enquanto o mundo se volta para a necessidade de estabilizar o efeito estufa e minimizar os impactos das mudanças climáticas, o que vemos no governo é o relaxamento dos licenciamentos ambientais.
por Carlos Nunes
Passados alguns meses da Conferência do Clima da ONU, a COP21, onde o Brasil teve papel de destaque nas discussões ambientais, com a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, à frente das negociações sobre objetivos como zerar o desmatamento, promover mudanças na matriz energética e implementar iniciativas nas cidades que reduzam a emissão de carbono, parece que seu discurso começa a se transformar em palavras dispersas ao vento, como vemos acontecer com as promessas políticas.
Parece que eles, governo, não entenderam nada. Enquanto o mundo se volta para a necessidade de estabilizar a concentração dos gases do efeito estufa e minimizar os impactos das mudanças climáticas, o que vemos nas três esferas de governo, Federal, Estadual e Municipal, é uma forte tendência de relaxamento dos licenciamentos ambientais, em nome de uma agilização que, na realidade, pretende esconder o verdadeiro problema dos atrasos, que é a falta de estrutura dos órgãos licenciadores.
No dia 08 de março de 2016, os Ministérios Públicos Federal e do Estado de São Paulo, que vale ressaltar, no âmbito ambiental, é o que nos resta de esperança e luz no fim do túnel, promoveram uma importante audiência para debater justamente os impactos das recentes propostas de alterações no licenciamento ambiental no Brasil, em curso no Congresso Nacional (Projeto de Lei nº 654/15 e Projeto de Lei nº 3.729/04) e CONAMA (revisão e alteração das Resoluções CONAMA 01/86 e 237/97, proposta da ABEMA), que terão como consequências danosas:
- Diminuição de prazos para análises técnicas de alta complexidade,
- Supressão de fases do procedimento de licenciamento,
- Dispensa de EIA/RIMA,
- Redução da interferência da sociedade civil, entre outras.
Parece um movimento orquestrado entre os três entes federativos, que tentam minar a democracia participativa, diminuindo a participação da sociedade civil, que quando escutam, não consideram. Vão encolhendo a estrutura dos órgãos licenciadores e fazem tudo em nome do “desenvolvimento” a qualquer preço.
Os órgãos licenciadores, ainda que tenham corpo técnico concursado, são dirigidos por indicados e contaminados pelo poder político, através de coerção. Normalmente, ignoram recomendações, sempre favorecendo o poder econômico que os financiam, desconsiderando que dependemos dos recursos naturais muitas vezes relegados a última prioridade, e desconsiderando também os impactos sociais, raramente levados a sério.
O processo de licenciamento ambiental atual já é falho em diversos pontos pois, entre outras incoerências, atribui ao empreendedor a contratação e custeio dos estudos ambientais (EIA/RIMA), um verdadeiro conflito de interesses, e não prevê estudos de impactos cumulativos e sinérgicos, decorrentes da existência de vários empreendimentos em uma mesma região.
Enquanto os municípios não contam com corpo técnico para efetuar com eficiência mesmo os licenciamentos simples, o Estado segue promovendo cortes, afrouxando as regras e repassando a responsabilidade para as prefeituras: enfim, um desmonte generalizado.
Há 10 anos, tínhamos duas agências ambientais no Litoral Norte composta pelos corpos técnicos do antigo DPRN e Cetesb. A fusão desses órgãos, com a proposta de integração e agilização dos processos, foi o primeiro passo para encolher a estrutura. Depois veio o fechamento de uma das agências, acumulando toda a demanda do litoral em São Sebastião e reduzindo a equipe de cerca de 40 servidores para apenas 17. Hoje, o atendimento é deficiente e a fiscalização é pífia.
Se não bastasse para região, agora o Ministério do Meio Ambiente pretende fechar o ESREG (Escritório Regional) Caraguatatuba do IBAMA, que atua em 40 cidades do Litoral Norte, Vale do Paraíba e Serra da Mantiqueira. Essa unidade historicamente vem sendo ameaçada de fechamento, sempre barrada pela força da Sociedade Civil. Um abaixo assinado corre atualmente na região para ser encaminhado à ministra.
Com a extinção do IBAMA a região, que é de alta relevância ambiental, ficará mais vulnerável aos processos de degradação inerentes ao modelo de desenvolvimento atual. Só a região do Litoral Norte, que compõe uma das maiores áreas contínuas de Mata Atlântica, considerada um dos cinco principais Hotspots da Biodiversidade no planeta, vem sendo severamente ameaçada com 13 projetos de alto impacto ligados a cadeia produtiva do Petróleo e Gás, incluindo o Pré-Sal, Corredor de Exportação do Vale do Paraíba com a ampliação do Porto de São Sebastião, ampliação do Terminal marítimo de óleo e duplicação de várias estradas, com inúmeros viadutos e túneis encravados em unidades de conservação.
Já enfrentamos sérios problemas como a falta de acompanhamento das inúmeras condicionantes estabelecidas nos processos de licenciamento, falta de fiscalização ambiental e emergências ambientais constantes, principalmente relacionadas a vazamentos.
E o mais lamentável é que tais decisões de alterações nos órgão licenciadores são tomadas sem nenhum tipo de consulta pública, por governos em todas as esferas que se dizem democráticos, mas que agem com flagrante desrespeito à sociedade e à democracia participativa.
Desarticulação dos órgãos licenciadores, relaxamento dos licenciamentos, coerção dos corpos técnicos por forças políticas e desconsideração dos impactos das mudanças climáticas:
Isso sim é um crime ambiental.