Introdução
Este artigo busca refletir sobre a experiência de constituição de uma rede de movimentos da sociedade civil organizada que tem como objetivo construir o controle social sobre o estado, baseado no desenvolvimento de instrumentos de monitoramento dos poderes públicos, como indicadores técnicos e pesquisas de percepção, somados às mudanças institucionais que permitam a transparência e o total acesso às informações de direito público.
Para além do controle social realizado por meio da efetivação do princípio da publicidade, “origem filosófica e empírica do Estado democrático” ( Fonseca, 2007) garantido na Constituição de 1988, a rede tem como valor fundamental a democracia participativa, fruto de um duplo fenômeno do Brasil contemporâneo: a clara percepção dos limites e descaminhos da democracia representativa realizada por meio de partidos e da auto-capacitação de vários setores da sociedade civil organizada que conjuga o princípio da participação com a sua qualificação para o exercício participativo.
O conhecimento do passado como um meio para romper com ele (Giddens, 1991), no caso a história política brasileira, legitima o profundo questionamento que hoje recai sobre a democracia representativa pura, geralmente avessa ao controle social. A experiência da democracia brasileira, nos últimos 25 anos, ao mesmo tempo em que revelou avanços e surpresas positivas na realização da alternância do poder e na sua estabilidade institucional, não cessa de produzir gestões, em todos os níveis, autocráticas e pouco eficientes, além de escândalos em série, praticamente naturalizando a associação da corrupção à atividade política, atingindo todos os principais partidos que têm se revezado no poder.
A inspiração para desencadear o processo de construção da Rede foi justamente a reflexão sobre esta história recente da política brasileira, que tem desafiado todos aqueles que atuam na esfera pública com espírito público. “O uso da história para fazer história, é substancialmente um fenômeno da modernidade….. é uma versão da reflexividade da modernidade” ( Giddens, 1991). Indo mais longe, os limites e desgastes da democracia representativa não devem se resumir à sua historicidade e ao caso brasileiro em particular, dado que formas mais arrojadas e democráticas de organização sociopolítica já têm, também, a sua historicidade, assim como habitam várias teorias – dos clássicos gregos e iluministas a pensadores contemporâneos (Bobbio, 1987) – além de projetos de diversos segmentos sociais em nível global.
A experiência abordada a seguir, em seu processo de construção, combina muitos destes elementos, ou seja, história, empirismo e mobilização social, patrimônio ético de lideranças, referências teóricas, domínio de novas tecnologias da informação e formas de conectividade social. Controle social e democracia participativa completam-se na mobilização de diversos atores sociais que buscam a superação das forças inerciais de reprodutibilidade da atual cultura política (Bobbio, 1988) para a construção de um processo social capaz de gerar um outro modelo de estado e de desenvolvimento.